12/13/2003

Web e Ironia

Escreva uma ironia sutil num email e perca um amigo online. A sutileza, a ironia fina, o subtexto, não passam pelos filtros da rede. O que chega é o equívoco. Para ser claro e ser entendido com correção é preciso adotar uma outra linguagem, que contenha os antídotos para a frieza do meio e se adapte às possíveis intepretações do leitor. Post, colunas, emails, não estão em real time.

Na comunicação instantânea do messenger, icq, etc, ainda dá pra corrigir os enganos. Nos outros casos, cabe a explicação. Como aqui no blog.

Por ser um espaço razoavelmente antigo (o blog veio do farofa, que é do milênio passado), por ter uma comunidade fixa de frequentadores, por ser tão vorazmente atualizado, por mim e pelos leitores que comentam os posts, acabamos por desenvolver uma série de 'in jokes', piadas internas, como acontece em qualquer grupo, seja no trabalho, na escola, na aldeia. Todo grupo tem sua linguagem.

Assim, quando falo do UOL e do TCHAN no cantinho de cima, só quem já passou por aqui centenas de vezes, compreenderá que eu adoro o UOL, que é minha homepage desde seu lançamento, que gosto muito de várias pessoas que trabaham lá, que já fui convidada tanto para levar o antigo farofa para lá quanto para ser coordenadora de todos os chats (declinei do convite há anos, com muita dor, porque eu apresentava um jornal ao vivo na tv naquela época). E que, me sinto à vontade para criticar o UOL exatamente por essa familiaridade.

Uma dessas críticas é a constante presença de notícias sobre o Tchan, qualquer integrante, ex-integrante ou futura integrante do grupo, sempre no cantinho superior direito. É o assunto mais recorrente do site.
Comento sempre isso porque a 'imagem' pública da Folha de São Paulo, inevitavelmente associada ao UOL, não combina com o tema.

Um Caderno como a Folha Ilustrada, que já dedicou capa aos dez anos de morte do pianista cubano Bola de Nieve, não comporta a popularidade industrializada das proporções marqueteiras do grupo O TChan. Eles não estão na pauta deste jornal. Pelo menos, nos trinta anos que leio a folha, eu não me lembro de ter visto o tema como destaque dos cadernos de cultura e lazer. (Veja aqui, outra armadilha: Bola de Nieve? Quem é Bola de Nieve? Foi o que me perguntei quando vi, em 1981, uma extensa matéria sobre o pianista da Ilustrada. Coicidentemente, hoje tem uma foto dele no caderno2 do Estadão. A sensação causada é a de que, estou muito aquém do altíssimo nível cultural da publicação. Foi isso que eu quis dizer, a Folha é muito 'culta' e não se dá ao luxo de publicar coisas popularescas. )

Para compreender a ironia, é preciso ser conivente com o autor, assim como a conivência é necessária para rir de uma piada. As piadas que o Tom Cavalcante conta, que o Ary Toledo conta, que o Juca Chaves conta, que o JÔ Soares conta, só recebem risos e aplausos daqueles que os conhecem e admiram. Ninguém ri de um desafeto, por melhor que a piada seja. Da mesma forma, a ironia só encontra eco quando o leitor está disposto a gastar uma taxa extra de neurônios para compreender a sutileza. E uma dose de afeto para apreciá-la. Se você não gosta de uma pessoa, qualquer deslize de ironia é porta de entrada para o ataque viral da sua ira.

Acho que um blog, por ser uma publicação pessoal, acaba desenvolvendo também seu repertório interno junto à comunidade de amigos leitores, o que de uma certa forma pode 'fechar' portar para a compreensão dos que chegam. Se por um lado é natural, por outro, afasta novos amigos. Boas vindas aos que chegam, é para vocês que estou aqui escrevendo tudo isso.

Os que frequentam, sempre tentam defender o patrimônio por nós, coletivamente desenvolvido (mesmo que seja um patrimônio de abobrinhas...) mas é preciso ter sempre o afeto e a delicadeza de não usar o que sabemos que sabemos e que os outros não sabem, como argumento para a rispidez. E esse recado é para mim, que tenho pouca paciência em muitas ocasiões.

Mas está bom do jeito que está. Quando alguém não entende alguma coisa muito 'interna', a gente abre e explica. Num dos posts abaixo, o destaque sutil da duplicidade de notas chamando para o mesmo tema, a semelhança entre homem e macaco, é que os macacos copiam. Assim, a repetição criou um chiste interno de macaquice, não sendo uma crítica lógica à diagramação.

Em resumo, sem humor, não tem solução.

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