6/24/2003

Tipos



As novas modalidades de pesquisa de consumo não classificam mais as pessoas apenas pelo número de secadores de cabelo, cortadores de unha e barbeadores elétricos que possuem em suas casas. Nem só pela renda anual, nível de escolaridade e número de penicos e banheiros na residência.
Há algum tempo, o melhor jeito de classificar o consumidor é fazendo seu perfil psicográfico.
No começo, pensei que fosse uma espécie de mapa astral de consumo mas é mais do que isso, é um perfil psicológico, social, mental, do indivíduo, que de alguma maneira misteriosa coloca na mesma coluna no sulfite impresso, pessoas que talvez jamais se encontrassem na vida e que, não tem nada mais em comum do que terem escolhido a mesma máquina de lavar pratos pelas mesmas razões.

Lendo os atributos que descrevem essas pessoas a gente sente até um certo desconforto e uma vontade imensa de procurar a si mesmo naquele monte de descrições. Exemplo: 'é uma mulher ativa e moderna mas que se sente culpada por cuidar mais do trabalho do que dos filhos'. 'adora receber gente em casa porque precisa dos aplausos e elogios dos convidados' ou, 'gosta de receber mas é tão autoconfiante que não se importa se as visitas não elogiarem a comida'.

A gente já sabe que está sendo monitorado o tempo todo, não só por causa das plaquinhas de 'sorria, você está sendo filmado' em prédios públicos, mas porque toda a indústria de produtos e serviços quer nosso dinheiro. Todo mundo que produz quer vender e todo mundo que vende quer um comprador. E todo mundo é comprador durante toda a vida. Por isso, todo mundo precisa saber tudo sobre nós, especialmente nossos pontos fracos porque eles são os portais de entrada da comunicação do marketing.

Um jeans que custa mil reais só é vendido porque a marca foi transformada em um símbolo de tudo o que aquela pessoa busca, status, reconhecimento, poder, sofisticação. É como se a pessoa ao comprar o jeans recebesse uma tatuagem na testa onde se lê 'estou por cima da carne seca'. O mesmo se aplica às mulheres que compram bolsinhas mínimas que custam milhares de dólares. Aquela bolsinha mal serve para abrigar a chave do carro e o batom mas é como um passaporte para o mundo do glamur das revistas de celebridades. O fotógrafo vai ver a bolsinha e logo vai perceber que naquela alça há uma mão de milionária ou candidata a celebridade. É a vida.

O mais incrível é que ninguém escapa disso, nem mesmo os jovens mais rebeldes. Soube ontem que um pesquisa brasileira recentemente classificou os jovens em 65 diferentes tipos de tribos. Garanto que todos se acham únicos e diferentes e que contestam todas as regras da sociedade de consumo. Fogem de umas e caem em outras regras. Não há exceção para quem consome.

A única chance seria a gente voltar ao mundo dos Waltons e criar o próprio carneiro, tosquiá-lo, fiar a lá, pegar dois gravetos e fazer a própria malha de tricô. Aí sim, não haveria etiqueta, griffe, loja, marketing, nada. Para isso, você teria também que alimentar o carneiro com comida orgânica que você mesmo plantou e adubou com o esterco da vaca ou da galinha. Sem fertilizantes porque senão você já caiu no consumo de produtos agrícolas.

Mas é difícil escapar mesmo assim porque em última instância, a menos que você viva numa fazendinha sem eletricidade, totalmente auto sustentável energeticamente, um ahora você teria que comprar combustível num posto e pimba, lá estaria uma grande marca a sua espera.

Essa tendência parece crescer a cada dia, a de psicografar hábitos de consumidores. Talvez fosse interessante uma empresa fazer o perfil psicográfico de todos os internautas. Aí sim, teríamos muita matéria pra publicar, muito assunto para discutir. Porque cada um de nós, na rede, tem a sensação de ser múltiplo, de ter muitas faces, de poder mais o que imaginamos. E quem, sabe, a marketing consiga transformar essa vontade que todo mundo tem de ser mais do que é para que cada um compre mais do que pode. Aí, sim, vai ser a festa do caqui de griffe!

Bom dia.
Sem logos.

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