Esta ilustração de crianças está aqui porque o post ía se chamar "No Kids Allowed" mas, como um pókemon, evoluiu e mudou até de nome. Recebi um email da Alessandra, que mora na Inglaterra, comentando que em muitos lugares as crianças não são permitidas, como pubs e restaurantes. Ainda outro dia, comentávamos isso aqui na Synapsys , que em muitos países da Europa, aceita-se a presença de cães e gatos mas não de crianças.
Enquanto eu pensava nessas coisas, entre uma garfada e outro da minha tradicional Caesar Salad (mudei o molho, pelo menos; eles, mudaram o queijo ralado), um sentimento me veio à mente: a inveja das viagens alheias.
Toda vez que alguém fala de alguma viagem para algum país, a pessoa precisa ter consciência de que isso, despertará, em muita gente, o sentimento de inveja. Porque a viagem ou melhor, a idéia de viagem é sempre uma ilusão muito diferente do que o fato.
Antigamente, leia-se 'no meu tempo', quando os aviões que operavam no Brasil eram poucos (Eletra, Pan Air...) quando alguém ía para os Estados Unidos ía para os 'Estêites', ou para a América. Quando alguém ía para a Europa ía para o 'exterior', ou 'para fora'. A gente se sentia preso, isolado, aqui dentro de um Brasil que não tinha importação e nem mobilidade.
Só gente 'bem' ou filho de gente bem ía para o exterior. Voar de avião era um sonho. E ainda é, para muita gente.
Curioso é que, algumas viagens despertam mais inveja que outras. Há pouco tempo, uma colega daqui da agência, fez uma grande viagem, começando pela Índia. Ninguém ficou com inveja dela ir pra Ìndia. Acho que as pessoas imaginam uma Índia suja, com vacas soltas, gente tomando banho num rio sujo, gente mendigando pelas ruas. A imagem da Índia pobre não causa inveja em ninguém. Ao contrário, ninguém exclamou 'nossa, eu também quera ir!' e sim coisas como 'tome vacina antes', 'leve remédios' e etc.
Já quando ela disse que depois da Índia iria para a Califórnia, a história mudou . 'Sortuda! Eu queria estar nos eu lugar!Califórnia'. Deve ser a influência do Lulu Santos cantando 'garota eu vou pra califórnia, vou ser artista de cinema'. Sabe, Califórnia, tem Hollywood e aí, todo mundo quer.
Durante muitos anos, eu morria de vergonha de jamais ter ido pra Europa. E, toda vez que alguém me perguntava 'você conhece paris? conhece Veneza? Conhece Roma? Conhece Barcelona?' e eu ía enfiando meus nãos como contas em um colar, via-me obrigada a arrematar com um não mais definitivo, continental, dizendo 'não, eu nunca fui pra Europa'. Muitas gente olhava pra mim com ar de indignação, outros de compaixão, outros de desprezo mesmo.
Nunca ter ido para a Europa deve soar como uma espéce atestado de pobreza, não só financeira como intelectual, cultural, turística. Já não ter ido nunca para os Estados Unidos é diferente, parece mais uma opção ideológica da pessoa. Não ter ido para o Oriente não quer dizer nada , mas ter ido é sempre uma coisa 'exótica', só para quem já cumpriu todos os roteiros 'obrigatórios' para chegar até lá.
Não entendo muito bem esta classificação mas ela parece existir para todos os continentes. Primeiro a gente tem que ir para a Disney, eu acho, ou algo que tenha a ver com os Estados Unidos. Depois, você vai para a Europa (pode-se inverter a ordem também, é até mais chique). Depois a pessoa vai para 'lugares' como Grécia, Japão, Marrocos (este, na África. ninguém acha chique ir para a África, com poucas exceções). Austrália e NOva Zelândia também já entraram para o circuito de gente alternativa bacana há algum tempo. Não sei dizer muito bem como está a cotação de ambos no ranking de 'chiqueteria'.
O que eu sei da revista Caras é que ficou 'chique-classe-média' casar em qualquer ilha da Polinésia. Já vi muita legenda de foto de gente que casou no Tahiti, embora o casamento não tenha validade legal. Não é legal, mas e daí, é bacana! Já estou cansada de ver artistas naquele famoso hotel 6 estrelas da África, que deve viver só das permutas e dos sonhadores que vão lá pra ver se encontram uma equipe da Caras fotografando. Quem sabe o cara sai na mesinha do fundo na hora do café da manhã do casal de atores.
Fato é que a Internet é a nossa grande viagem, a possibilidade de conhecer, viver, interagir, quase sentir, o mais próximo de 'estar lá' do que se imaginou. É possível ver pelas web cams o que acontece nas ruas, visitar museus, tudo. É evidente que a viagem real é insubstituível, que quando alguém perguntar se você já viu o Louvre você vai dizer que 'não', se não tiver ido pessoalmente. Mas talvez você possa dizer, sim, conheço virtualmente.
As viagens trazem uma lição importante, a transitoriedade da vida e a permanência da dívida.... Ficam as fotos, as lembranças, o sentimento. Ficam os débitos pingando no cartão pelo resto do tempo... Fica, especialmente (e por isso a gente viaja) o encontro da gente com o mundo, o redimensionamento dos problemas, o exercício de viver o novo.
Quando se está a um oceano de casa a gente abre tanto, mas tanto o horizonte da visão, que tudo, passa a ter uma nova dimensão.
A gente diferencia o que é grande do que é pequeno.
A gente redescobre o valor da imensidão.
Viajar é crescer.
Deve ser disso que a gente sente inveja.
Fonte da Imagem: www.csiro.au/scientriffic
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